“The Unicorn in the Garden” de James Thurber.

Uma Breve Análise da tradução da obra quanto ao Uso das Modalidades. 

O objetivo deste trabalho é superficialmente analisar, de acordo com as linhas teóricas estudadas durante as aulas ministradas na disciplina “Prática de Tradução Literária a Análise da Língua Fonte e Alvo, a tradução publicada do texto “The Unicorn in the Garden” de James Thurber.  Pretendemos destacar aspectos quanto ao uso de diferentes modalidades nos textos traduzidos, discutir sobre o posicionamento das palavras nas frases traduzidas, como também destacar algumas especificidades em relação a estrutura do conto. Além disso buscaremos mostrar alguns aspectos relevantes sobre o uso da linguagem para se comunicar e como isso se reflete na fala traduzidas dos personagens desse conto.
Nossa proposta aqui é fazer uma breve análise da tradução publicada (TP) do texto “The Unicorn in the Garden” de James Thurber. Ao mesmo tempo em que analisaremos essa tradução publicada, faremos também uma rápida comparação dos textos com a nossa tradução (NT), neste caso tendo como referencia o mesmo texto fonte (TF). Na TP e na NT destacaremos o uso de diferentes modalidades nos textos traduzidos. Acerca do uso de modalidades no processo de tradução, nos apoiaremos em Aubert (1998). No que diz respeito ao posicionamento das palavras, verbos adjetivos e advérbios etc., nas frases traduzidas, contaremos com as contribuições de Benedetti, (2010, online). Para termos um olhar especial em relação a estrutura do conto, teremos o apoio de Allegro (2009).
Com o intuito de reforçar as idéias de Allegro (2009), nos apoiaremos também nos apontamentos de Ilari (2013) que discute, entre outros aspectos relevantes, sobre o uso da linguagem para se comunicar, neste caso algumas falas dos personagens do conto em questão, traduzidas e que aqui serão analisadas. Após essa humilde analise do conto, “The Unicorn in the Garden”, esperamos atingir os objetivos aqui propostos. Nos fragmentos observados a seguir faremos uma breve análise quanto ao uso das modalidades estudadas na obra de Aubert (1998). Para darmos inicio a nossa proposta, podemos começar com os trechos seguintes.

TF
Once upon a sunny morning a man who sat in a breakfast nook looked up from his scrambled eggs to see a white unicorn with a golden horn quietly cropping the roses in the garden.
TP
Era uma vez, numa manhã de sol, um homem que estava sentado à mesa tomando seu café da manhã. Num momento, ele olhou dos seus ovos mexidos para fora da casa e viu um unicórnio branco com um chifre de ouro calmamente comendo as rosas do jardim.
NT
Era uma manhã ensolarada um homem sentado à mesa da cozinha olhava sobre os ovos mexidos e pela janela via um unicórnio branco com um chifre dourado calmamente mastigar as rosas no jardim.

Na TP e na NT podemos destacar o uso da modalidade addition. O tradutor incluiu as palavras (num momento) por conta própria. Nós também incluímos (cozinha \ pela janela), pois no fragment do (TF) acima essas palavras não estão presentes. Mas isso não significa necessariamente um problema no processo de tradução. Na visão de Aubert (1998), adição é “Any textual segment included in the Target Text by the translator on his/her own account, not motivated by any explicit or implicit content of the original text. Addition must therefore not be mistaken for one of the forms of transposition (one word translation as a sequence of words – phrase), nor for explicitation”. (AUBERT, 1998, p.9).

TF
The man went up to the bedroom where his wife was still asleep and woke her. "There's a unicorn in the garden," he said. "Eating roses." She opened one unfriendly eye and looked at him. "The unicorn is a mythical beast," she said, and turned her back on him. The man walked slowly downstairs and out into the garden.
TP
O homem subiu para o quarto onde sua esposa ainda estava dormindo e a acordou. "Tem um unicórnio no jardim," ele disse. "Comendo rosas." Ela abriu um olho, não muito amigável, e olhou para ele. "O unicórnio é uma besta mítica," ela disse, e deu-lhe as costas. O homem desceu vagarosamente as escadas e foi para o jardim.
NT
O homem foi até o quarto onde sua esposa ainda estava dormindo e a acordou. "Há um unicórnio no jardim", disse ele. "Comendo as rosas". Ela lhe deu uma hostil olhada. "O unicórnio é um animal mítico", disse ela, e virou-lhe as costas. O homem lentamente desceu as escadas e foi ao jardim.

Para a tradução do fragmento no TF (She opened one unfriendly eye and looked at him) o tradutor colocou no TP (Ela abriu um olho, não muito amigável, e olhou para ele). Em vez disso, optamos por colocar na NT (Ela lhe deu uma hostil olhada). Nós fizemos o uso da modalidade transposição. Em contra partida, o tradutor do TP usou a modalidade Literal translation. Em relação a ultima modalidade, Aubert (1998) afirma: “Within the descriptive model presented herein, literal translation is synonymous of word-for-word translation, in which, upon comparing the Source Text segment and the Target Text segment, one finds (i) the same number of words, in (ii) the same syntactical order, employing (iii) the ‘same’ word classes and (iv) the lexical choices can be contextually described as interlinguistic synonyms, e.g.: Her name is Mary ↔ Seu nome é Maria”. (AUBERT, 1998, p.6).
Na NT percebemos a presença da modalidade  Transposition e que difere da opção feita pelo tradutor do TP. Aubert (1998) pondera que “This modality occurs whenever at least one of the three first criteria for literal translation is not met, i.e., whenever morphosyntactic rearrangements take place. Thus, for instance, if two or more words are collapsed into a single word (as in I visited Visitei) or, on the contrary, expanded into several lexical units (e.g. Kindergarten  Jardim de Infância), or if the word order is altered in any manner (as in remedial action  ação saneadora), or if there is a change in word class (e.g. should he arrive late  se ele chegar atrasado) or any combination of these is found, however ‘literal’ the respective meanings may be said to be, they are not structurally literal, and are classified as transpositions.” (AUBERT, 1998, pp.7-8).
A frase do TF (The man walked slowly downstairs and out into the garden) foi traduzida no TP (O homem desceu vagarosamente as escadas e foi para o jardim) e na NT (O homem lentamente desceu as escadas e foi ao jardim). Vemos que a posição dos advérbios (vagarosamente e lentamente) estão em locais diferentes, no que diz respeito a ordem das palavras na frase. Neste caso, aparentemente nenhum problema é visto e nem soa estranho quando lemos as traduções. Para nós, essa sensação acontece porque a língua portuguesa tem grande flexibilidade com as palavras. Entretanto, em línguas estrangeiras, por exemplo, inglês e francês não têm essa flexibilidade. Benedetti (2010), ao falar sobre a prática de tradutores e também sobre o uso da primeira língua por falantes nativos em geral, percebemos uma crítica muito severa em relação o uso da modalidade decalque  - quando temos palavras de língua estrangeiras usadas como se fossem palavras da língua do falante, em sua língua nativa.
A proposito, não percebemos a presença do uso dessa modalidade nos textos traduzidos. Contudo, acerca do posicionamento das palavras em textos (em línguas diferentes), Benedetti (online) afirma o seguinte: “A criação de estruturas estranhantes em certos idiomas é um ato de coragem. Isso ocorre em inglês e francês, por exemplo, línguas nas quais as posições de sujeitos, verbos, objetos e advérbios são legisladas com mão de ferro. O oposto é o português. Temos uma flexibilidade espantosa. Chegamos às raias da anarquia. Metemos os advérbios onde bem entendemos, podemos criar verdadeiros bailes de sujeitos e verbos numa troca atordoante de passos. Intercambiamos infinitivos e gerúndios com a maior cara de pau e não somos capazes de perceber a diferença entre este e o particípio presente porque reduzimos tudo a um denominador incomum, e ninguém parece se escandalizar”. (BENEDETTI, 2010, ONLINE).

TF
The unicorn was still there; he was now browsing among the tulips. "Here, unicorn," said the man and pulled up a lily and gave it to him. The unicorn ate it gravely.
TP
O unicórnio ainda estava lá; ele agora estava mastigando as tulipas. "Aqui, unicórnio," disse o homem, e ele pegou um lírio e o deu ao animal. O unicórnio comeu o lírio serenamente.
NT
O unicórnio ainda estava lá; ele agora estava andando entre as tulipas. "Aqui, unicórnio", disse o homem dando um lírio para o animal. Sem hesitar, o unicórnio comeu a planta.

O fragmento no TF (he was now browsing among the tulips) foi traduzido no TP como (ele agora estava mastigando as tulipas), porém na NT preferimos (ele agora estava andando entre as tulipas), pois acreditamos que (andando em vez de comendo) é o que o TF sugere. Para a tradução do idioma ingles para o portugues encontramos (to browse = navegar olhar, olhar sem interesse ou olhar despretencioso). Contudo, nao ficamos satisfeitos com essas definiçoes e ao pesquisarmos um pouco mais, encontramos alguns sinonimos em ingles para o verbo (to browse = to graze, surf, range, pasture, shop etc.). Entretanto, apesar de não vermos nenhum problema na opção feita pelo tradutor do TP, nossa escolha nos agradou mais nesse caso. Além disso, fizemos o uso da modalidade adição quando inserimos as palavras (sem hesitar), pois isso não aparece no TF. Por sua vez, o tradutor do TP fez uma tradução mais próxima da tradução literal, pois, para efeito de entendimento do leitor, todos nós optamos por usar substantivos em vez de pronomes, os quais se fazem presentes em todo o TF e nem sempre se repetem nos textos TP e NT.

TF
With a high heart, because there was a unicorn in his garden, the man went upstairs and roused his wife again. "The unicorn," he said, "ate a lily." His wife sat up in bed and looked at him, coldly "You are a booby," she said, "and I am going to have you put in a booby-hatch."
TP
Feliz da vida, porque havia um unicórnio em seu jardim, o homem subiu as escadas e acordou sua mulher novamente. "O unicórnio," ele disse "comeu um lírio." Sua esposa se sentou na cama e olhou para ele, friamente. "Você é insano," ela disse "e eu vou te mandar para o manicômio."
NT
Emocionado, pois havia um unicórnio em seu jardim, o homem subiu as escadas e novamente acordou sua esposa. "O unicórnio", disse ele, "comeu um lírio." Sua esposa ​​sentou-se na cama e olhou para ele, friamente" Você é um louco", disse ela, "e eu vou te mandar para um asilo”.
TF
The man, who never liked the words "booby" and "booby-hatch," and who liked them even less on a shining morning when there was a unicorn in the garden, thought for a moment. "We'll see about that," he said. He walked over to the door.
TP
O homem que nunca gostou das palavras "insano" nem "manicômio," e que gostava ainda menos de ouví-las numa manhã de sol quando havia um unicórnio em seu jardim, pensou por um momento. "Veremos," ele disse. Ele andou em direção à porta.
NT
O homem que nunca gostou das palavras “louco" e "asilo", e dessas palavras gostava menos ainda em uma manhã de sol radiante e quando havia um unicórnio no jardim, pensou por um momento. "Vamos ver", disse ele. E caminhou até a porta.
TF
"He has a golden horn in the middle of his forehead," he told her. Then he went back to the garden to watch the unicorn; but the unicorn had gone away. The man sat among the roses and went to sleep. 
TP
"Ele tem um chifre de ouro no meio de sua testa," ele disse para ela. Então ele voltou para o jardim para ver o unicórnio; mas este já se tinha ido. O homem sentou-se entre as rosas e caiu no sono.
NT
"Ele tem um chifre dourado no meio de sua testa," disse a ela. Em seguida, ele voltou para o jardim para observar o unicórnio; porém o animal já havia partido. O homem sentou-se entre as rosas e caiu no sono.
TF
And as soon as the husband had gone out of the house, the wife got up and dressed as fast as she could. She was very excited and there was a gloat in her eye. She telephoned the police and she telephoned the psychiatrist; she told them to hurry to her house  and bring a strait-jacket.
TP
Assim que seu marido foi para fora de casa, a esposa levantou-se e se vestiu o mais rápido que pôde. Ela estava muito excitada e havia um brilho doentio em seus olhos. Ela telefonou para a polícia e telefonou para o psiquiatra; ela disse para eles terem pressa em chegar a sua casa e para que trouxessem uma camisa de força.
NT
E assim que o marido se ausentou da casa, a mulher levantou-se e se vestiu o mais rápido que podia. Ela estava muito agitada e com um olhar maligno. Ela ligou para a polícia e para o psiquiatra; dizendo para virem rapidamente a sua casa e trazer uma camisa de força.
TF
When the police and the psychiatrist looked at her with great interest. "My husband," she said, "saw a unicorn this morning." The police looked at the psychiatrist and the psychiatrist looked at the police. "He told me it ate a lily," she said.
TP
Quando os policiais e o psiquiatra chegaram eles se sentaram em cadeiras e olharam para ela, com grande interesse. "Meu marido," ela disse "viu um unicórnio esta manhã." Os policiais olharam para o psiquiatra e o psiquiatra olhou para os policiais. "Ele me disse que o animal comeu um lírio," ela disse.
NT
Quando a polícia e o psiquiatra questionaram a mulher com grande interesse. "Meu esposo”, disse ela, "viu um unicórnio esta manhã.” A polícia e o psiquiatra se olharam. "Ele me disse que o unicórnio comeu um lírio”, acrescentou ela.
TF
The psychiatrist looked at the police and the police looked at the psychiatrist. "He told me it had a golden horn in the middle of its forehead," she said. At a solemn signal from the signal from the psychiatrist, the police leaped from their chairs and seized the wife.
TP
Os policiais olharam para o psiquiatra e o psiquiatra olhou para os policiais. "Ele me disse que o bicho tinha um chifre de ouro no meio da testa," ela disse. A um sinal solene do psiquiatra, os policiais levantaram-se dum pulo de suas cadeiras e agarraram a esposa.
NT
Olharam-se novamente. Ela continuou. “Ele me disse que o unicórnio tinha um chifre de ouro no meio da testa", De maneira solene o psiquiatra e a polícia saltaram de suas cadeiras e agarraram a mulher.

Além da omissão de alguns pronomes nos textos traduzidos para o idioma português, nos fragmentos acima, percebemos alguns detalhes quanto à escolha lexical, porém nosso trabalho não nos permite discutir todos eles. Portanto, nos debruçaremos apenas sobre as seguintes escolhas: mulher\esposa. Na TP (A um sinal solene do psiquiatra, os policiais levantaram-se dum pulo de suas cadeiras e agarraram a esposa.) e na NT (De maneira solene o psiquiatra e a polícia saltaram de suas cadeiras e agarraram a mulher).
A escolha da palavra esposa em vez de mulher, especificamente neste caso, a opção do tradutor do TP preserva o valor da palavra no contexto (casamento) enquanto a escolha da palavra mulher pode levar o leitor a entender que essa não seja necessariamente a esposa. Acreditamos que manter ou preservar a essência e os valores das palavras (wife = esposa), principalmente seus valores semânticos nesse contexto, deve ser uma obrigação e tarefa do tradutor. Contudo, além desse exemplo, essa preocupação se perde parcialmente em ambos os textos (TP e NT), pois em outras passagens a palavra (wife) foi traduzida às vezes como esposa e às vezes como mulher.

TF
They had a hard time subduing her, for she put up a terrific struggle, but they finally subdued her. Just as they got her into the strait-jacket, the husband came back into the house. 
TP
Eles tiveram muito trabalho para dominá-la, pois ela resistiu com muita força, mas eles finalmente a dominaram. Assim que eles a puseram dentro da camisa de força, o marido voltou para dentro de casa.
NT
Foi difícil segurá-la, pois ela resistia a todo custo, no entanto eles finalmente conseguiram controlá-la. Assim que eles colocaram nela a camisa de força, o marido retornou.

Novamente, para discutirmos sobre os trechos acima acerca do uso da modalidade transposição, recorremos a Aubert (1998). Ele afirma que a transposição ocorre quando essa modalidade, de alguma maneira, se difere da tradução literal. Sendo assim, no TP, podemos dizer que houve o uso da modalidade transposição (Eles tiveram muito trabalho para dominá-la, pois ela resistiu com muita força, mas eles finalmente a dominaram.). Já em NT, quanto a modalidade, está mais proxima de modulação (Foi difícil segurá-la, pois ela resistia a todo custo, no entanto eles finalmente conseguiram controlá-la). Como aponta Aubert (1998), a modulção é semelhante à transposição, entretanto “Modulation is said to occur whenever a given text segment is translated in such a manner as to impose an evident shift in the semantic surface structure, albeit retaining the same overall meaning effect in the specific context and co-text. What makes modulation different from transposition is that the translational equivalence can only be recovered by observing the context-bound sense”. (AUBERT pp.7-8).

TF
"Did you tell your wife you saw a unicorn?" asked the police. "Of course not," said the husband. "The unicorn is a mythical beast." "That's all I wanted to know," said the psychiatrist.
TP
"O senhor disse a sua esposa que viu um unicórnio?" perguntou um dos policiais. "Claro que não," respondeu o marido. "O unicórnio é uma besta mítica." "Era tudo que eu queria saber," disse o psiquiatra.
NT
"Você disse a sua esposa que tinha visto um unicórnio?” perguntou o policial. "Claro que não", disse o marido. "O unicórnio é um animal mítico." "Isso é tudo o que eu queria saber", falou o psiquiatra.

Vemos que na TP ("Era tudo que eu queria saber,") há a omissão do pronome (that) e na NT ("Isso é tudo o que eu queria saber") a omissão não ocorre. Entretanto, obviamente neste caso, acreditamos que essa omissão não afeta o entendimento do leitor. Porém essa possibilidade existe. Para Allegro (2009), em um conto literário, nada deve ser tirado ou adicionado, pois tudo é pensado sob medida. Uma subtração ou um acréscimo pode levar o leitor a interpretação diversa. 
A tradução no TP ("O senhor disse a sua esposa que viu um unicórnio?") parece ser a escolha mais adequada comparado com a nossa escolha para a NT (“Você disse a sua esposa que tinha visto um unicórnio?”).   Fizemos uma tradução literal (you = você) enquanto o tradutor da TP fez uma adaptação. Provavelmente ele pensou na maneira como um policial falaria com o casal. De fato, para o pronome de tratamento (você), a palavra (Senhor) soa bem melhor na tradução ou transcrição da fala do policial. 
Segundo Ilari (2013), "Existem na língua expressões que são adequadas para a formação vaga dos fatos que se quer narrar ou descrever, mas que devem ser evitadas quando se pretende uma formulação mais exata." (ILARI, 2013, p.47). Esse autor explica que existem nomes de pessoa, apelidos ou jeitos especiais para se referir a um indivíduo ou a um grupo de pessoas em um dialogo, por exemplo. Assim sendo, quando o policial faz uso da linguagem para se comunicar com o personagem do conto (o esposo), ele precisa adequar o jeito de falar e de se comunicar com o personagem. Esse mesmo policial, naturalmente, pode ser capaz de mudar sua linguagem para falar com outros indivíduos em diversos outros contextos. 

TF
"Take her away. I'm sorry, sir, but your wife is as crazy as a jay bird." So they took her away, cursing and screaming, and shut her up in an institution. The husband lived happily ever after. 
TP
"Levem-na. Sinto muito senhor, mas sua esposa está doida de pedra." Então eles a levaram, praguejando e gritando, e a trancaram num hospício. O marido viveu feliz para sempre, desde então.
NT
"Pode leva-la. Sinto muito, senhor, mas sua esposa está lelé da cuca". Então, eles a levaram, xingando e gritando, e trancou a mulher em um asilo. O marido viveu feliz para sempre.

Tanto no TP (mas sua esposa está doida de pedra) quanto no NT (mas sua esposa está lelé da cuca) percebemos o uso da modalidade adaptação. “This modality is typically a cultural assimilative procedure; i.e., the translational solution adopted for the given text segment establishes a partial equivalence of sense, deemed sufficient for the purposes of the translational act, but abandons any illusion of ‘perfect’ equivalence, including cultural false cognates”(AUBERT, 1998, p.8). Acreditamos que, nesse caso, apesar de haver distinção entre as nossas escolhas, elas sejam bem aceitas pelos leitores brasileiros.

TF
Moral: Don't count your boobies until they are hatched. 
End
TP
MORAL: Não conte com o ovo no cú da galinha!

NT
Moral: Cautela nunca é demais.
Fim.

Acima, no fragmento do texto publicado (TP) encontramos a modalidadeadaptation na tradução da moral do conto. Com base nos apontamentos de Aubert (1998), “This modality is typically a cultural assimilative procedure; i.e., the translational solution adopted for the given text segment establishes a partial equivalence of sense, deemed sufficient for the purposes of the translational act, but abandons any illusion of ‘perfect’ equivalence, including cultural false cognates”.(AUBERT, 1998, p.8).
No mesmo fragmento também observamos uma Omission (Fim), palavra que está presente no TF e NT, porém foi omitida no TPAcerca dessa modalidade Aubert diz o seguinte: “Omission occurs whenever a given text segment of the Source Text and the information it contained cannot be traced in the Target Text. This qualification is required because, in a number of instances, although the one-to-one correspondence is lost, the information as such is nevertheless recoverable within the Target Text, as in transpositions and implicitations”. (AUBERT, 1998, p.5).
Essa omissão ocorre no final do conto e talvez, a nosso ver, não apresente nenhum problema grave. Entretanto, a omissão nas primeiras ou nas ultimas linhas de um conto, de acordo com ALLEGRO (2009), não é uma opção recomendada. Ela ressalta que omitir ou substituir palavras do texto fonte no texto alvo pode causar uma falta muito grande para o leitor. Na medida do possível, o tradutor deve respeitar as características do texto original, caso contrario, as ideologias presentes no texto fonte  podem não ser preservadas no texto alvo. Allegro reforça que nada no conto é aleatório. Para ela, no conto cada elemento textual tem valor de ouro. Dessa forma, podemos dizer que nesse gênero textual nada deve ser desconsiderado, pois todos os elementos exercem funções pré-estabelecidas pelo autor.
Ao ler no texto fonte (TF) a moral da história, optamos por outra modalidade, a fim de evitar a palavra obscena presente no fragmento acima (TP). Por isso no primeiro momento, em nossa tradução (NT) optamos por Transposition.“This modality occurs whenever at least one of the three first criteria for literal translation is not met, i.e., whenever morphosyntactic rearrangements take place”.(AUBERT, 1998, p.7). Para este autor, se, por exemplo, algumas palavras são traduzidas em uma única palavra (I visited = visitei) ou se houver mudanças na classe de palavras (should he arrive late = se ele chegar atrasado) ou ainda a combinação disso tudo, porém o enunciado expressa a mesma ideia apesar de não apresentar a mesma estrutura, podemos chamar de transposição. Isso foi o que veio a nossa mente quando traduzimos a moral do conto TF (Moral: Don't count your boobies until they are hatched) para NT (Moral: Cautela nunca é demais) e TP (MORAL: Não conte com o ovo no cú da galinha!).
Mudança de plano. Ao lermos nossa tradução, percebemos que a modalidade que primeiramente escolhemos não se encaixava bem e por isso mudamos a nossa percepção quanto a modalidade. Para tanto, recorremos a Aubert (1998), pois como a modulação é semelhante à transposição, um olhar despercebido pode levar a uma possível confusão acerca dos conceitos. Provavelmente, isso foi o que nos ocorreu, pois (Cautela nunca é demais) é muito mais que uma transposição; acreditamos que seja uma modulação. Por isso, consideramos essa mudança, como sendo uma opção mais assertiva, comparada com a anterior. Contudo, para a moral do conto, vemos a opção do tradutor do TP bem mais apropriada do que a nossa opção.
Allegro (2009) fala sobre inadequações nos textos traduzidos. Com base em seus estudos, ela apresenta o seguinte trecho: “The next to the Hell is taken by the translator Who intentionally skips words or passages that He does not bother to understand or that might be obscure or obscene to readers (...).” (ALEGRO, 2009, p.11). Definitivamente, essa passagem nos convenceu a concordar com a opção da tradução da moral no TF, pelo tradutor do TP. Apesar de não haver nenhuma palavra obscena no TF, a adaptação da moral (Não conte com o ovo no cú da galinha!) nos parece adequada nesse contexto. Ainda assim, daríamos preferência a transposição (não conte com o ovo ainda na galinha).
Ao longo de nosso trabalho, podemos enxergar através de Benedetti (2010), que a língua portuguesa tem grande flexibilidade com as palavras. Entretanto, essa flexibilidade dificilmente está presente em línguas algumas línguas estrangeiras, como o inglês e francês. Além disso, percebemos que o posicionamento das palavras em textos de línguas estrangeiras ”são legisladas com mão de ferro” e que são muito diferentes do nosso idioma português.
Após o contato com as idéias de Allegro (2009), o que para nós representava uma atitude inofensiva a estrutura do conto, agora nos faz olhar para esse gênero textual com outros olhos. Isso nos servirá de base a futures analise e traduções de outros textos cujos gêneros se assemelham e para tradução de textos em geral. Percebemos que é preciso ler com muita atenção. Muito vezes um olhar de raio-x é exigido para que possamos enxergar o que não pode ser observado através de uma leitura desatenta por parte do tradutor.  
Para concluímos, pois, com base em tudo que discutimos, podemos afirmar que no processo de tradução podemos nos servir em um Buffet de opções e recursos tradutórios, porém é preciso saber quais opções se enquadram melhor aqui ou ali. Percebemos que tanto na NT quanto na TP foram utilizadas modalidades similares e em outros momentos as modalidades se diferem. No entanto, em ambos os textos, as modalidades soaram bem aos nossos ouvidos e desejamos que o leitor tenha essa mesma impressão.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALLEGRO, A. V. Do Conto e sua Tradução: Percalços do Gênero. Revista Brasileira de Tradutores, 2009.
AUBERT, F.H. Translation Modalities – A Descriptive Model for Quantitative Studies in Translatology. 1998. São Paulo, USP.
BENEDETTI, Ivone C. O mito da estranheza. Disponível em:
GALVEZ, José A. Dicionário Larousse inglês-português, português-inglês avançado. São Paulo: Larousse do Brasil, 2006.
ILARI, Rodolfo. Introdução a Semântica: brincando com a gramática. Ed. Contexto, 2013.

MORAIS, J. F. S.
Sobre o autor:

Graduação em Letras (Português e Inglês) pela Universidade Ibirapuera de São Paulo (2004). Especialista em Língua Inglesa pelo Centro Universitário Ibero-Americano (2008). Graduação em Pedagogia pela Universidade Nove de Julho (2012). Pós-graduado em Didática e Metodologia do Ensino Superior (2014) e tradução (Inglês e Português) pelo Centro Universitário Anhanguera de São Paulo (2016). Experiência no ensino de línguas desde 2000 e atualmente é professor em escola bilíngue e tradutor freelance.

Comments

Popular posts from this blog

Reflexões sobre a Escola da Ponte

Improve your essay writing skills!